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Boatos Apenas
A Terra-Mãe viveu sozinha por muitos séculos até que um dia Deus ficou entediado e resolveu dar a vida a dois bonequinhos de barro. Ao primeiro chamou Adão, responsável e trabalhador, e ao segundo, de aparência frágil e delicada, deu o nome de Eva.
– Ah, Eva! – suspirava Adão toda vez que a encontrava.
Mulher bonita, curiosa, não tardou a querer provar todas as frutas disponíveis no planeta e o resultado foi que uma bendita maçã dada por uma maldita serpente fez com que o casal fosse expulso do paraíso. Maçãs e serpentes à parte, Eva foi a responsável pela explosão demográfica do planeta.
Mas acontece que a terra-mãe não ficou nada satisfeita com a atenção agora dedicada àquela mulher, afinal Eva não era assim tãããããããããããão bonita. Ficou até feliz quando soube do terrível escândalo envolvendo os filhos de sua rival e fez questão de espalhar a notícia de que um dos meninos havia matado o outro por puríssima inveja.
Resolveu, então, demonstrar que poderia ser uma mãe mais eficiente e deu à luz a três filhos. A primeira a nascer foi a Água em um parto relativamente fácil. Dividindo-se em gotas atravessou várias camadas de solo até chegar à superfície. O maior grupo ocupou as enormes depressões e unido formou o oceano. O outro preferiu emergir do cume dos montes, eram mais aventureiros e viajavam morro abaixo levando vida por onde passava. Formavam os rios, lagos e lagoas e percorriam grandes distâncias para se unirem aos parentes no mar.
O segundo filho nasceu depois, meio que por acaso, em meio a uma brincadeira familiar. A Terra-Mãe quis mostrar à filha outros caminhos que não os da depressão ou o das alturas: caminho de si mesma. Sugou a Água do chão com um de seus muitos membros – as árvores – mas percebeu o quanto a filha se sentia solitária e fez nascer da parte mais verde de seus membros – com uma pequena colaboração da Água – o seu segundo filho, o Ar.
Viveram harmonicamente por um longo período até que por motivo ainda desconhecido houve um profundo desentendimento entre a Terra-Mãe e o Ar e por ocasião desse incidente nasceu o Fogo, imprevisível e de temperamento explosivo.
Enquanto os dois primeiros filhos eram serenos e espalhavam vida por onde passavam, o Fogo a destruía e o pior, sugava a energia do seu irmão mais velho a cada ataque de chamas que lançava.
A Água, filha afortunada, pouco sofria com as chamas que o Fogo expelia. O calor agia sobre suas moléculas, tornando-a invisível. Embora não fosse esse o real motivo da estranha "indulgência", alguém como o Fogo dificilmente concederia poder tão útil a quem quer que fosse, ainda que esse alguém fosse a própria irmã.
O que se seguiu foi uma guerra, o Fogo foi ficando mais ousado à medida que seu poder ia aumentando. Nem mesmo a Terra-Mãe era capaz de detê-lo. Seus planos ambiciosos incluíam o domínio sobre todo o território terrestre.
– Ou a senhora me entrega todos os continentes do planeta ou seu filho Ar morre.
A Terra-Mãe não cedeu de início, guardava um segredo muito antigo, que o caçula desconhecia, um detalhe sutil e fundamental na criação que evitaria um desastre familiar semelhante ao dos filhos de Eva.
Infelizmente o Fogo não quis saber de acordos. À medida que as Eras se passaram o Ar foi enfraquecendo, a energia vital se esvaindo dolorosamente, até que chegou a um ponto no qual a Terra-Mãe não teve escolha: ou cedia à chantagem ou o Ar, já tão rarefeito, morreria.
As terras do Norte foram cedidas, a contragosto, ao Fogo.
A Terra-Mãe, muito sábia, sabia que a paz não duraria mais do que algumas Eras, afinal o Fogo só havia conseguido a posse das terras do Norte: ele queria todas. Em uma tentativa de retardar ainda mais um novo confronto repartiu o restante das terras entre os outros filhos. O Ar ficou com a parte sul das terras do extremo Oeste, a Água ficou com a parte sul das terras do centro. Somente alguns fragmentos de terra do extremo-Leste continuaram sob a guarda da Terra-Mãe.
E para desespero da Terra-Mãe, o Fogo ficou profundamente encantado com a beleza monumental de Eva, que lhe gerou um filho a partir da mistura de seu próprio barro, uma fração de corrente de ar retirada da combustão de suas chamas e uma boa dose de água, assunto de posteriores brigas conjugais.